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Resumo: O artigo discute a crescente insatisfação de eleitores de baixa e média renda com as políticas tradicionais de esquerda no Brasil. Apresenta dados de pesquisas que indicam uma queda na aprovação do governo Lula entre esse grupo, mesmo com o aquecimento da economia. Explora a influência de valores morais e religiosos, especialmente os evangélicos, como fatores importantes nessa mudança de comportamento eleitoral. Analisa o impacto da autonomia proporcionada por novas formas de trabalho e a ascensão de ideais de direita entre os mais pobres.
A Mudança no Cenário Político e a Reavaliação de Ideologias
O Brasil, conhecido por suas complexas dinâmicas políticas e sociais, parece estar passando por uma transformação silenciosa, mas significativa. Há tempos, a intelectualidade e os partidos de esquerda construíram a narrativa de que pessoas com menos recursos financeiros deveriam, naturalmente, alinhar-se com as políticas de esquerda. A lógica, por vezes, beirava a paternalista, sugerindo que a ajuda estatal seria a única tábua de salvação para os menos favorecidos. No entanto, o cenário político atual demonstra que essa visão simplista não condiz com a realidade.
Os resultados das últimas eleições e as pesquisas recentes indicam que o eleitorado de baixa e média renda, tradicionalmente ligado ao Partido dos Trabalhadores (PT), está reavaliando suas opções. Essa mudança de perspectiva não pode ser ignorada, pois reflete uma transformação profunda nos valores e nas prioridades de uma parcela considerável da população.
Dados e Pesquisas: Onde Estão as Mudanças?
Institutos de pesquisa renomados, como Quaest, AtlasIntel, Datafolha e CNT/MDA, têm apontado para uma queda na popularidade do presidente Lula entre o eleitorado com menor poder aquisitivo. Mesmo em um momento de aquecimento econômico, com crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e redução do desemprego, fatores que historicamente impulsionam a aprovação popular, a insatisfação com o governo persiste.
A Visão do Eleitorado de Baixa Renda
A pesquisa CNT/MDA, divulgada em fevereiro de 2025, revelou um dado alarmante para o governo: a desaprovação de Lula entre os eleitores que ganham até dois salários mínimos atingiu 35%, um aumento de 11 pontos percentuais em relação a novembro de 2024. Para contextualizar, em maio de 2023, no início do governo, essa desaprovação era de apenas 19%.
Ao analisar as qualidades atribuídas ao presidente, a pesquisa mostra que, embora 20,1% dos brasileiros considerem que Lula “cuida dos pobres”, uma parcela significativa (36,5%) não enxerga nenhuma qualidade nele, e 21,7% o veem como “desonesto”. Esses números sugerem que, apesar de o discurso do presidente ainda ter ressonância em parte do país, sua capacidade de mobilizar o eleitorado de baixa renda está em declínio.
O Fim do “Truque” Populista
A estratégia de distribuir benefícios, que historicamente funcionou para angariar apoio político, parece não estar surtindo o mesmo efeito. Um exemplo disso foi a reação negativa nas redes sociais de trabalhadores informais diante da ampliação do monitoramento do Pix pelo governo. Essa medida, vista como uma forma de aumentar a arrecadação, gerou desconfiança e frustração entre aqueles que dependem de atividades informais para sobreviver.
O Impacto da Autonomia e as Novas Formas de Trabalho
A ascensão de novas formas de trabalho, como os aplicativos de transporte e entrega, também desempenha um papel importante nessa mudança de cenário. Esses modelos de negócio, apesar de apresentarem desafios em termos de segurança e direitos trabalhistas, ofereceram uma alternativa de autonomia e flexibilidade aos trabalhadores.
A tentativa do governo de regulamentar o trabalho por aplicativo gerou protestos e resistência por parte dos trabalhadores, que temem a burocratização e a perda da liberdade conquistada. A resistência a sindicatos e a busca por alternativas de trabalho refletem um desejo por autonomia e aversão à intervenção estatal excessiva.
A Influência dos Valores Morais e Religiosos
Um dos fatores mais relevantes na mudança de comportamento eleitoral é a crescente influência dos valores morais e religiosos, especialmente entre os evangélicos. Muitas igrejas evangélicas promovem a disciplina pessoal, a resiliência e o empreendedorismo, valores que ressoam com a ideia de “ter que ir atrás do prejuízo e trabalhar”, como define o filósofo Luiz Felipe Pondé.
O Ambiente Evangélico e o Empreendedorismo
O ambiente das igrejas evangélicas frequentemente incentiva a autonomia, a responsabilidade individual e a busca por oportunidades. Essa perspectiva contrasta com a visão tradicional de que o Estado deve ser o principal provedor de assistência. O antropólogo Juliano Spyer destaca que a igreja ajuda a promover a ascensão socioeconômica por meio do combate ao alcoolismo, do fortalecimento da autoestima e do investimento em educação.
O Pobre de Direita e a Busca por Valores
O sociólogo Jessé Souza, em seu livro “O Pobre de Direita”, explora a adesão das classes populares a ideais de direita, questionando a ideia de que esses grupos votariam contra seus próprios interesses econômicos. Souza argumenta que a moralidade e os valores conservadores podem ser fatores decisivos na escolha política.
A Batalha Pelos Corações dos Mais Pobres
O governo Lula tem demonstrado interesse em se aproximar do eleitorado evangélico, sancionando leis em homenagem a líderes religiosos e utilizando expressões religiosas em seus discursos. No entanto, essas estratégias não parecem estar surtindo o efeito desejado. A pesquisa da Mar Asset Management, intitulada “Vai na fé! O impacto eleitoral do crescimento dos evangélicos”, revela que os evangélicos são o grupo que mais reprova o governo Lula.
A Visão dos Evangélicos
O deputado federal Otoni de Paula, que tentou intermediar a relação entre o governo e os evangélicos, reconhece a existência de um “abismo” entre os valores do PT e os dos evangélicos. Para muitos evangélicos, os valores morais e religiosos são mais importantes do que qualquer benefício oferecido pelo governo.
O Crescimento do Segmento Evangélico
O relatório da Mar Asset Management destaca o crescimento expressivo do número de igrejas evangélicas no Brasil, com um aumento significativo entre 2010 e 2024. A expansão constante desse segmento social sugere que a influência dos evangélicos na política e na sociedade continuará a crescer.
O Futuro Político e os Desafios da Direita
Diante desse cenário, os autores do relatório “Vai na fé” projetam um futuro em que a proporção de evangélicos no Brasil continuará a aumentar, o que pode favorecer candidatos de direita nas eleições. No entanto, o sucesso da direita dependerá da capacidade de apresentar um candidato que dialogue com os valores e as expectativas desse eleitorado.
O Cenário Eleitoral de 2026
Com o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível até 2030, a direita enfrenta o desafio de encontrar um líder capaz de unificar as diferentes vertentes políticas e conquistar o apoio dos eleitores. A fragmentação da oposição e a dificuldade de apresentar uma alternativa consistente podem abrir espaço para que o PT se mantenha no poder, mesmo com a crescente insatisfação de parte do eleitorado.
Conclusão: Uma Nova Configuração Política em Curso
A análise do cenário político brasileiro revela uma transformação em curso, com o surgimento de um “pobre de direita” que questiona as políticas tradicionais e busca novas alternativas. A influência de valores morais e religiosos, a busca por autonomia e a insatisfação com o governo Lula são fatores que impulsionam essa mudança. O futuro político do país dependerá da capacidade dos partidos e dos candidatos de compreender e responder a essas novas demandas, construindo pontes e oferecendo soluções que atendam às necessidades de todos os cidadãos.
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